Estamos, novamente, travando uma batalha no Paraná e a
sociedade precisa ser alertada – e mobilizada – de mais um provável
embuste a ser confirmado se nenhuma medida for tomada a tempo de
reverter uma situação que atende mais aos interesses de
grupos econômicos do que aos anseios da população paranaense.
Trata-se dos acordos de leniência feitos pelo Ministério
Público Federal – MPF, no âmbito da Operação Lava Jato, com as
concessionárias do pedágio. Já escrevi sobre este assunto em recente
artigo e volto a reafirmar que esses acordos são lesivos
aos interesses do Estado, injustos com os paranaenses e atendem,
exclusivamente, às concessionárias que estarão livres para participar
das licitações da nova leva de concessões no Estado, já que o atual
modelo termina em 2021.
Se por um lado os acordos de leniência são importantes,
pois preservam as empresas e possibilitam a investigação por meio do
instituto da delação – feita pelos executivos e empregados, onde se
identifica a suposta participação de agentes públicos
e políticos em atos de corrupção que beneficiaram a si próprios,
terceiros e no caso a concessionária. Por outro eles levantam uma
questão crucial que coloca em xeque sua eficácia: a não realização das
obras previstas nos contratos originais das concessões.
Antes que políticos encagaçados e medrosos venham em
socorro da operação Lava Jato – como se questioná-los fosse um
sacrilégio, deixo claro que não está se discutindo aqui o histórico
trabalho de combate à corrupção sistêmica, promovido pelo
Ministério Público Federal, especialmente a operação Lava Jato.
Questiono, já que o sonho da CCR RodoNorte era fazer o acordo de
leniência, que o melhor momento para colocar a “faca no pescoço” dessa
gente era justamente agora. Infelizmente, provavelmente
por avidez em dar prosseguimento à investigação criminal de punição aos
corruptos, o MPF abriu mão de um acordo que fosse mais favorável ao
povo paranaense.
O exemplo claro é o acordo feito com a Rodonorte que deve
indenizar os usuários das rodovias em R$ 750 milhões – metade
convertida em redução de 30% da tarifa por um ano, apesar de recente
reajuste, e outros R$ 350 milhões em obras, além de uma
multa. Mas o cálculo da corrupção, daquilo que a concessionária causou
em prejuízo, segundo especialistas, passa de R$ 2,8 bilhões, ou seja,
ficou barato para a CCR/Rodonorte e o acordo passou a sinalizar que o
crime compensa.
O que acontece, além disso? O contrato original da
concessão com a Rodonorte prevê a integral duplicação da BR-376, entre
Ponta Grossa e Apucarana, a Rodovia do Café. Mais de 80 quilômetros
dessa duplicação estão excluídos no termo de leniência,
porque a concessionária alega que não tem recursos financeiros para
executar a obra, embora haja previsão contratual.
Para minha surpresa, ao ler o acordo de leniência,
verifiquei que o MPF trata isso no parágrafo 1º do artigo 7º como uma
questão a ser discutida judicialmente. O termo diz que o MPF poderá
propor ação civil pública com obrigação de fazer contra
a Rodonorte.
Reconheçamos, uma ação civil pública não vai dar em nada,
até porque a Justiça Federal sempre deu ganho de causa as
concessionárias na manutenção do abusivo artigo LXV do Contrato entre o
Estado do Paraná e as concessionárias.
Dessa forma, o acordo libera de forma definitiva a
Rodonorte a participar de futuras licitações com o poder público, mas o
prejuízo ao povo paranaense será permanente. A duplicação da BR-376
dificilmente será viabilizada e esse acordo, ao que
consta, repete a máxima do escritor italiano Giuseppe Tomasi di
Lampedusa (1896-1957): “Algo precisa mudar para tudo continue como
está”!
Um outro ponto que chama atenção e que precisa ser
esclarecido é o porquê o Estado do Paraná, na condição de poder
concedente, foi excluído do acordo. Nem o Departamento de Estradas de
Rodagem (DER) e a Procuradoria Geral do Estado (PGE) foram
chamados a participar da discussão.
Além de não ter sido ouvido, o Estado não assinou, não
aceitou e se recusou a anuir o acordo porque entende que é contrário ao
interesse público. Os posicionamentos do governador Ratinho Junior, da
procuradora-geral do Estado, Letícia Ferreira,
e dos procuradores do Estado, foram muito corretas, ou seja, o Estado
disse não ao acordo de leniência.
Na Assembleia Legislativa, fiz esta denúncia na tribuna e
encaminhei requerimento à Comissão de Obras Públicas que imediatamente
se reuniu e deliberou por realizar uma audiência pública em que serão
convidados a PGE, a Agência Reguladora do Paraná
(Agepar), o MPF, a Rodonorte, para esclarecer os pontos não tratados no
acordo de leniência e especialmente, por que a concessionária foi
desobrigada de fazer a duplicação da BR-376.
A Rodovia do Café, ao lado da BR-277, que liga Paranaguá a
Foz do Iguaçu, é umas das espinhas dorsais do Paraná. Faz a ligação
entre Curitiba e o Norte e Noroeste do Estado, é uma estrada
importantíssima. Se perdermos esse momento da duplicação,
esse trecho entre Ponta Grossa e Apucarana, sabe-se lá quando será
duplicado.
Mais do que exigir que a Rodonorte coloque uma placa na
estrada admitindo a roubalheira e a corrupção, e o cândido “pedido de
desculpas” o acordo de leniência deveria obrigar a concessionária a
fazer as obras de duplicação.
Aliás, a duplicação da Rodovia do Café já deveria ter
sido feita há muito tempo. Quantas vidas foram ceifadas por conta da
omissão da concessionária e de agentes públicos corruptos?
Da forma como está, o acordo dá à Rodonorte uma licença
para continuar matando nas rodovias que tem a obrigação de duplicar. O
acordo consolida e garante que o crime compensa.
As concessionárias corromperam agentes públicos, causaram
prejuízos, sangraram a economia do Estado, participaram de uma
licitação viciada – estou denunciando isso há mais de 20 anos – e agora
estão desobrigadas a fazer as obras previstas em
contrato.
O fato concreto é que o acordo de leniência garante a impunidade da Rodonorte.
Não podemos concordar com esses acordos de leniência e
nós vamos ter que aprofundar esse debate, essa discussão. O Estado do
Paraná tem que agir com firmeza. A permanecer o acordo de leniência como
está significa dizer – vou repetir pela terceira
vez – que o roubo compensa. As concessionárias que desviaram bilhões
vão voltar a participar de novas concorrências e poderão operar no
Paraná, ofendendo a moralidade pública e administrativa. Vão pagar uma
pequena parcela do que roubaram e não precisam fazer
as obras de duplicação previstas.
É um descalabro histórico.
Luiz Claudio Romanelli, advogado e especialista em gestão urbana, é deputado estadual pelo PSB do Paraná.
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