Não bastasse a crise econômica, politica e institucional, o
Brasil vive um momento especialmente preocupante, com a articulação
entre forças políticas tradicionais e milícias formadas a partir das
redes sociais que se unem em torno de pautas retrógradas e radicais. É
um tempo de trevas.
A jornalista Eliane Brum faz uma analise certeira e lucida
sobre esse fenômeno que cresce no país há alguns anos, em sua coluna no
El Pais Brasil, a partir do fechamento da mostra Queer Museum –
Cartografia da Diferença na Arte Brasileira, em Porto Alegre.
Na coluna ela traça uma linha temporal sobre como temas
morais foram pautados em sucessivas eleições, contaminando o debate
politico. A partir daí movimentos (ou milícias como ela apropriadamente
os define) passaram a disseminar suas “bandeiras”, como o fim das cotas
raciais, a Escola sem partido, redução da maioridade penal, fim do
desarmamento, e tantas outras.
O debate sobre os verdadeiros problemas brasileiros foi
substituído por esses temas morais rastaqueras. “Com esse truque de
ilusionismo coletivo se desvia da necessidade de mudar algo muito mais
estrutural em um dos países mais desiguais do mundo”, analisa.
Um ponto essencial para entender como chegamos a esse estado
de trevas em que a realidade e os problemas reais são substituídos por
temas acessórios é o poder de comunicação que pode servir a determinados
projetos de poder.
“O poder destas milícias está em mostrar que são capazes de
se comunicar com as massas e, portanto, de influenciar tanto eleitores
quando odiadores, num momento histórico em que estas duas identidades se
confundem. E este é um enorme poder, que claramente tem sido colocado a
serviço de políticos e de partidos tradicionais”, explica Brum.
Vivemos tempos de intolerância e de ódio que se espalha tal e
qual fogo morro acima no território sem dono da internet e das redes
sociais e com consequências imprevisíveis no campo politico.
A Influência desses movimentos e/ou milícias nas redes
sociais – reverberada pelos meios de comunicação- ainda não pode ser
mensurada. Alguns políticos, como João Dória e Jair Bolsonaro, já
perceberam o poder das milícias e dos tais influenciadores digitais para
arregimentar seguidores e disseminar suas mensagens.
Se ainda não se pode medir com exatidão a capacidade de
influenciar e arregimentar dessas milícias, é um fato inegável que há um
recrudescimento da intolerância, do conservadorismo e autoritarismo no
país, uma onda de direita a exemplo do que acontece também na Europa,
onde partidos de extrema direita avançam com seu discurso nacionalista e
xenófobo.
Preocupante que o discurso de medo e ódio das redes sociais
seja reproduzido nos veículos de comunicação. Aqui no Paraná, essa
direitização chegou ao mais tradicional veiculo de comunicação do
Estado. Para meu espanto, acompanho a desconstrução da imagem do
educador Paulo Freire, a apologia a Bolsonaro e até a reprodução da
acusação de heresia ao papa Francisco.
Que ninguém se engane, disso não resulta coisa boa. O
inimigo hoje é a exposição do Santander em Porto Alegre, a exposição do
MAM em São Paulo, a peça de teatro com um Cristo transgênero, (de mau
gosto na minha avaliação), mas amanhã o alvo do ódio pode ser qualquer
um, inclusive você. Porque como a história nos mostra, o inimigo pode
ser mudado conforme a conveniência. Com consequências também
imprevisíveis.
Boa Semana! Paz e Bem!
*Luiz Cláudio Romanelli, advogado e
especialista em gestão urbana, ex-secretário da Habitação, ex-presidente
da Cohapar, e ex-secretário do Trabalho, é deputado pelo PSB e líder do
governo na Assembleia Legislativa do Paraná.
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