"Fábrica de revelações", Matsubara agoniza no abandono



O espólio da mais famosa fábrica de jogadores do estado divide espaço com sofás, mesa de centro, cristaleira, mesa de jantar, impressora e escrivaninha. Entre o escritório, a sala de estar e a sala de jantar de sua casa, Sueo Matsubara empilha os troféus conquistados ao longo de três décadas pelo time batizado com o sobrenome da família. Qua­­se todos de categorias de base.
Dono de uma estrutura re­­­­­­vo­­­­lu­­cionária quando inaugurada, o time alviverde de Cambará espalhou pelos gramados inúmeras de suas revelações, do pacotão rubro-negro Jorge Luís-Tico-Ratinho ao atacante de Copa do Mundo Nilmar; dos irmãos Jean Carlo e Sidclei ao ex-zagueiro santista To­­ninho Carlos.
Hoje, o Matsubara é uma pálida imagem desse passado. A Vila Olímpica, primeiro centro de treinamento do país, está sendo demolida. O Estádio Olímpico Regional é pivô de uma ação judicial em que o clube é réu da própria torcida. O time profissional vem de um ano de inatividade após três temporadas na terceira divisão estadual. Reabrir as portas, só com o apoio de um investidor que dificilmente existirá.
Com o time trazido da vi­­zinha Bandeirantes – empres­­tada pelo ‘co-irmão’ União – e o dinheiro das fazendas de algodão mantidas pela família, o Matsubara venceu a Segundona em 1976 e, no ano seguinte, estreou na primeira divisão esta­­dual com um animador séti­­mo lugar. O time mandava seus jogos no acanhado está­­dio Santana. Recebeu da Federação Paranaense permissão para jogar ali por um ano. A exigência por uma casa nova desencadeou um caso único no futebol: uma torcida construir um estádio para o próprio time.
“Éramos uma torcida de bandeira até 1977. No ano seguinte, montamos uma comissão de arrecadação. Com rifa, doação e venda de cadeira cativa, conseguimos, em um ano e meio, levantar o dinheiro necessário e construir o estádio”, conta Waldir de Camargo, filho de Vicente de Camargo, o responsável pelas comissões de arrecadação e construção, e atual presidente da Torcida Organizada do Matsubara, a TOM. Única organizada do planeta a ser dona de um estádio.
O Olímpico Regional foi inaugurado em 1980. Abertura que não encerrou o trabalho da TOM. A organizada manteve seu sistema de arrecadação para ampliar as arquibancadas. Usou contatos políticos para comprar e instalar a iluminação. O Matsubara correspondia com boas campanhas e levas de bons jogadores.
‘Imigrante’
A aventura do Matsubara em Londrina coincidiu com um período de dificuldade nos negócios da família. As restrições trabalhistas ao cultivo de algodão, essencialmente manual, acabaram com a lucratividade da lavoura. Algumas das 12 fazendas de algodão foram arrendadas para o cultivo de cana de açúcar. A principal delas, a 3M, acabou leiloada para quitar uma dívida de crédito rural com o Banco do Brasil.
Risco sanitário
A Vila Olímpica é tida como o primeiro CT do Brasil, em Cambará. Hoje o gramado deu lugar a um matagal que quase encosta no travessão do campo principal. Sem telhado, verte água do teto para o chão, transformando os alojamentos em focos de dengue. Vidros quebrados e paredes descascadas completam o cenário. Este mês as casas devem começar a ser demolidas. O terreno de 60 mil metros quadrados será dividido em 200 lotes de 200 metros quadrados cada, com preço estimado para a venda em R$ 20 mil.
Padrinho
O Matsubara ingressou no profissionalismo em um período de entressafra no Norte Pioneiro, final dos anos 70. A crise do café havia dizimado quase todas as equipes da região, entre elas a Cambaraense, representante da cidade entre os anos 50 e 60, com direito a um vice-campeonato em 1953. O único sobrevivente era o União Bandeirante, bancado pela usina de cana de açúcar da família Meneghel. Foi Serafim Meneghel quem deu o impulso que cata­­pultou o Matsubara da Taça Paraná à elite profissional. “Emprestei o time inteiro, técnico, bola para eles jogarem a segunda divisão. Só não emprestei as traves”, conta o dono do falecido União.

FONTE: Jornal Gazeta do Povo
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